#38 Shin Gojira (2016)

 

Os horrores do dia a dia vão muito além de pessoas malévolas, assassinos a sangue frio e por aí vai. Muito do que podemos sentir como algo pavoroso vem como consequência de outros fatores, de outras ações que estão mais ligadas ao pensamento e ação de burocratas e que fazem suas decisões escorrerem por toda a sociedade fazendo muitas pessoas sofrerem.

O diretor Hideaki Anno é muito conhecido por sua participação em animes clássicos, como Macross e Evangelion, mas ele também fez sua incursão no cinema live-action e, no caso aqui apresentado, no cinema kaiju (sub-gênero, principalmente, do cinema japonês onde monstros gigantes existem). Quando ele começou a ideia de homenagear o monstro gigante japonês conhecido como Godzilla, ele também tinha a intenção de homenagear outros dois símbolos do Japão, fazendo uma trilogia conhecida como "Shin" ("coração" ou "puro", podendo ser lido como "verdadeiro" em tradução livre). Daí veio Shin Ultraman e, mais adiante, virá Shin Kamen Rider.

O que importa é que Godzilla é uma franquia extensa e que já rendeu dezenas de filmes e remakes e versões americanas. A história básica, e simbólica, é a de que Godzilla seria um monstro criado como resultado da poluição radioativa das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki. Principalmente no original, de 54, o monstro é uma alegoria para o terror causado pelas bombas na história dos japoneses. Essa ideia viria a ser reutilizada em outros da franquia, mas o que importa é que ela se tornou algo de lugar-comum em toda a sua história.

Com Hideaki Anno, houve uma interessante mudança de ideia sobre o grande terror causado pela destruição de um ser de tamanhos colossais. É claro que é perturbador ver um lagarto bombado com energia radioativa andando pela cidade e matando muitos cidadãos por onde passa, mas o interesse em suas motivações é diminuído quando entendemos o porque ele faz isso por tanto tempo. As instituições japonesas, tão diligentes com seus aparatos militares e sua precisão, demoram horas para tomarem uma simples decisão.

Departamentos atrás de departamentos precisam assumir algum posicionamento antes que possa passar sua informação ao próximo responsável que também precisa tomar uma decisão e repassá-la a outro superior e assim sucessivamente. O povo espera um revide, uma salvação, algo que segure a criatura! Mas os engravatados, os políticos estão em segurança refletindo sobre como um ser assim pode existir ao invés de tomarem diretivas urgentes.

Talvez para um fã da franquia, Shin Gojira seja um filme até mesmo ruim visto que em suas duas horas não temos nem o terror abertamente destrutivo do original nem as incontáveis lutas que o monstro teve ao longo de seus diversos filmes, mas Hideaki Anno soube muito bem como reinventar esse horror retirando o foco de uma fórmula decididamente batida e trazendo algo real e novo para o universo de Godzilla. Fica aqui meu convite para que assistam tanto esse filme como, pelo menos, o primeiro de 1954. Poderão se surpreender bastante!



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